quarta-feira, 27 de abril de 2011

O trágico fim do meu cabelo























Eu tinha várias coisas para escrever, passei o dia organizando tudo na minha cabeça, mas sempre acontece isso: Quando chega o momento de passar tudo para o papel, me some da mente e meus pensamentos ficam todos desorganizados.
Mas vou tentar refazer minhas idéias.
Eles eram lindos, grandes, brilhosos e lisos, sim, estou falando dos meus cabelos e porque no passado? Porque anteontem resolvi que ia cortar-los.

Era mais de um metro de cabelo, chegava à metade da bunda. Entrei no salão decidida a passar por uma das maiores torturas pra mim. Mas quando soltei o cabelo para jogar naquela pia que é usada para lavar cabelos, a cabeleireira se assustou com o tamanho.
Pois bem... Lavou, penteou, alisou, ajeitou, repartiu e isso tudo bem aflita- notava-se. Eu havia sido breve com o meu pedido sobre picotar meu cabelo e cortar as pontas da franja, mas ela parecia estar com muito medo de fazer besteira- não sei quem estava com mais medo, eu ou ela.
Ela alisava, abria a tesoura, ameaçava cortar e parava, limpava o suor, penteava, olhava pra mim, fazia mil perguntas sobre o corte e voltava com a tesoura. Parou denovo, mostrou revistas, cortes, me fez dar certeza do que eu queria, fez várias vezes a mesma pergunta: Vai mesmo cortar tudo isso?
A moça parecia suar frio. Minha mãe chegou até a pensar na possibilidade de ela desistir de tocar naquela cabeleira toda, suava feito um porco no cio.
Mas a mulher foi valente. Depois de inúmeras tentativas e quase se peidando de medo, meteu a tesoura e fez o corte mais bonito que alguém podia ter feito.
Tentei juntar os pedacinhos.
“- Você tem o habito guardar quando corta?” – perguntou a moça.
Minha mãe, com a resposta na ponta da língua, respondeu: “Não, ela não tem o habito de cortar”.
E é verdade. Parece que tirei uma parte de mim.
Não fui onde eu costumo cortar porque não abre segunda e este é o único dia que eu tenho para fazer isso. Além do mais, percebi que meu cabeleireiro tem medo de mexer no meu cabelo, porque uma vez, aos 12 ou 13 anos, eu não gostei do corte, fechei a cara, não falei nada e saí, fiquei esperando minha mãe pagar, do lado de fora do salão.
Passados uns dias, voltei, pedi desculpas e disse que adorei, porque realmente depois ficou bonito, mas deixei-o numa situação complicada. Enfim, não quero mais cortar com ele porque dali em diante ele nunca mais cortou direito por medo- compreensível.
O problema maior é que ninguém reparou.
Eu sempre abominei a idiota pergunta: “Você cortou o cabelo?”
“- Não, fiz bainha”, pelo amor de deus, mas que pergunta, né. Mas dessa vez, tudo que eu mais queria era ouvir as pessoas perguntando ou ao menos notando que tirei 2 ou 3 palmos de cabelo.
Hoje, tentando exibi-lo para uma amiga, ouvi dela a resposta: “Que foi? Cortou?” SE EU CORTEI? COMO ASSIM SE EU CORTEI? Eu tiro quase todo meu cabelo, passo por uma tortura, fico toda feliz achando que todo mundo vai reparar que cortei aquele cabelão enorme que chamava a maior atenção, e NINGUÉM nota.
Até que hoje, na faculdade, uma colega de classe veio com a pergunta: “cortou o cabelo?” Respondi toda feliz: - Sim! Seguido de um enorme sorriso.
“-Ficou lindo”. Pronto, era tudo que eu queria ouvir. Que cortei e que ficou bonito. Poxa, mas ela nem é minha amiga. Minhas amigas mesmo nem repararam. Triste fim pra mim. Trágica história. Achei que todo mundo ia notar, afinal, quase 6 meses que não dava se quer um cortezinho. Tem 3 anos que meu cabelo não fica curto desse jeito e nem pras pessoas repararem.
Não as culpo! A vida é muito corrida, temos que estar ligados em tudo e muitas vezes, certos detalhes nos passam despercebidos. Tudo bem!
O importante é que eu gostei.

Tristeza permitida

 

Se eu disser pra você que hoje acordei triste, que foi difícil sair da cama, mesmo sabendo que o sol estava se exibindo lá fora e o céu convidava para a farra de viver, mesmo sabendo que havia muitas providências a tomar, acordei triste e tive preguiça de cumprir os rituais que faço sem nem prestar atenção no que estou sentindo, como comer, colocar uma roupa, ir pra faculdade, assistir as aulas, etc – se eu disser que foi assim, o que você me diz? Se eu lhe disser que hoje não foi um dia como os outros, que não encontrei energia nem pra sentir culpa pela minha letargia, que hoje levantei devagar e cedo demais por causa do problema na serra e que não tive vontade de nada, você vai reagir como? 
Você vai dizer “te anima” e me recomendar um antidepressivo, ou vai dizer que tem gente vivendo coisas muito mais graves do que eu (mesmo desconhecendo a razão da minha tristeza), vai dizer pra eu colocar uma roupa leve, ouvir uma música revigorante e voltar a ser aquela que sempre fui, velha de guerra.
Você vai fazer isso porque gosta de mim, mas também porque é mais um que não tolera a tristeza: nem a minha, nem a sua, nem a de ninguém. Tristeza é considerada uma anomalia do humor, uma doença contagiosa, que é melhor eliminar desde o primeiro sintoma. Não sorriu hoje? Medicamento. Sentiu uma vontade de chorar à toa? Gravíssimo, telefone já para o seu psiquiatra. 
A verdade é que eu não acordei triste hoje, nem mesmo com uma suave melancolia, está tudo normal. Mas quando fico triste, também está tudo normal. Porque ficar triste é comum, é um sentimento tão legítimo quanto a alegria, é um registro de nossa sensibilidade, que ora gargalha em grupo, ora busca o silêncio e a solidão. Estar triste não é estar deprimido. 
Depressão é coisa muito séria, contínua e complexa. Estar triste é estar atento a si próprio, é estar desapontado com alguém, com vários ou consigo mesmo, é estar um pouco cansado de certas repetições, é descobrir-se frágil num dia qualquer, sem uma razão aparente – as razões têm essa mania de serem discretas. 
Cazuza ainda dizia, lá no meio dos versos, que pega mal sofrer. Pois é, pega mal. Melhor sair pra balada, melhor forçar um sorriso, melhor dizer que está tudo bem, melhor desamarrar a cara. “Não quero te ver triste assim”, sussurrava Roberto Carlos em meio a outra música. Todos cantam a tristeza, mas poucos a enfrentam de fato. Os esforços não são para compreendê-la, e sim para disfarçá-la, sufocá-la, ela que, humilde, só quer usufruir do seu direito de existir, de assegurar seu espaço nesta sociedade que exalta apenas o oba-oba e a verborragia, e que desconfia de quem está calado demais. Claro que é melhor ser alegre que ser triste (agora é Vinícius), mas melhor mesmo é ninguém privar você de sentir o que for. Em tempo: na maioria das vezes, é a gente mesmo que não se permite estar alguns degraus abaixo da euforia. 
Tem dias que não estamos pra samba, pra rock, pra hip-hop, e nem pra isso devemos buscar pílulas mágicas para camuflar nossa introspecção, nem aceitar convites para festas em que nada temos para brindar. Que nos deixem quietos, que quietude é armazenamento de força e sabedoria, daqui a pouco a gente volta, a gente sempre volta, anunciando o fim de mais uma dor – até que venha a próxima, normais que somos.
Regurgitofagia: Talvez seja disso que eu esteja precisando: Regurgitar, uma palavra que nem mesmo sei falar com facilidade. Regurgitar: vomitar. Fagia: comer. Então regurgitofagia é simplesmente expelir o inútil e voltar a se alimentar do que precisamos. E do que precisamos? Anote aí, é pouca coisa: silêncio, arte e amor. Bom dia a todos.
(Martha Medeiros – Adaptado)